Por: Túlio Leite | Prompte et Sincere

    Certa vez, fui pregar em uma igreja que estava em processo de compreender a teologia reformada. Durante uma conversa com o pastor local, fiquei sabendo de um líder de outra igreja na cidade que é chamado de… querubim! Não bastaram os títulos como bispo, bispo primaz, pastor presidente, apóstolo ou até “paipóstolo” – todos de origem terrena. Nosso ilustre líder escolheu algo de origem celestial.

    Ironias à parte, esses títulos carregam um significado: “sou o maior, sou diferenciado, vocês me respeitem porque tenho autoridade”. No entanto, futuros pastores da igreja de Cristo, lembrem-se de que não são super-homens e manifestem o estilo de liderança ensinado por Jesus. Em Mateus 20.25-26, nosso Senhor disse: “Vocês sabem que os governantes deste mundo têm poder sobre o povo, e que os oficiais exercem sua autoridade sobre os súditos. Entre vocês, porém, será diferente” (NVT). Jesus não estava criticando a autoridade hierárquica secular, que pode ser adequada em empresas e forças armadas, mas determinando que, na Igreja, a qualidade da autoridade deve ser diferente.

    Nos capítulos 10 e 11 de 2 Coríntios e nos capítulos 1 e 2 de Gálatas, vemos Paulo defendendo sua autoridade apostólica. Se ele tivesse uma autoridade dominadora, típica de muitos líderes de hoje, precisaria escrever tantas linhas? Não bastaria uma ordem para resolver os problemas? Ele poderia simplesmente excluir os que questionavam seu apostolado, já que era o pai espiritual dos gálatas (Gl 4.19). Contudo, Paulo optou por uma longa argumentação, que muitos líderes poderiam considerar humilhante, porque não era dominador do rebanho, mas edificador de vidas espirituais.

    Um exemplo contemporâneo ilustra o abuso de autoridade eclesiástica. Uma jovem cristã no Rio de Janeiro, grávida, procurou seu pastor pedindo transferência para uma igreja mais próxima de sua casa. O pastor respondeu: “Tem certeza de que quer sair de debaixo da minha cobertura espiritual? Você está prestes a ter um bebê.” A irmã interpretou isso como uma ameaça velada, temendo que algo ruim acontecesse com seu filho, e desistiu da mudança. É comum que líderes dominadores considerem quem sai de sua igreja como “ovelha rebelde”. Em igrejas assim, sair com honra é impossível.

    A Constituição da IPB nos lembra que “a autoridade dos concílios é espiritual, declarativa e judiciária, sendo-lhes vedado infligir castigos ou penas temporais e formular resoluções que, contrárias à Palavra de Deus, obriguem a consciência dos crentes.” No entanto, o abuso de poder pastoral encontra contraponto na rebeldia do povo, que, por vezes, se recusa a se submeter à liderança legítima. Como Paulo ironiza em 2 Coríntios 11.20, os coríntios desprezaram sua autoridade e se submeteram a líderes que os escravizavam e humilhavam. Para essas ovelhas, ele quase diz: “Vocês se merecem!”

    Cuidem, irmãos, do rebanho de Deus “com disposição, e não de má vontade; não pelo que lucrarão com isso, mas pelo desejo de servir a Deus. Não abusem de sua autoridade com aqueles que foram colocados sob seus cuidados, mas guiem-nos com seu bom exemplo. E, quando vier o Grande Pastor, vocês receberão uma coroa de glória sem fim.” (1 Pe 5.2-4, NVT).

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