Por: Tulio Leite | Prompte et Sincere

“Esta palavra chegou também ao rei de Nínive; e ele levantou-se do seu trono, tirou de si as suas vestes, cobriu-se de saco e sentou-se sobre a cinza.” (Jn 3.6)

Alguns comentaristas dizem que o livro de Jonas é uma reprimenda ao exclusivismo judaico. O povo de Israel tinha a incumbência de “proclamar a glória do Senhor às nações”, mas não o fez. E o livro expõe essa má vontade em cumprir o mandato de Deus na figura do profeta Jonas. Já no primeiro capítulo podemos notar o contraste entre a compaixão dos marinheiros pagãos e a falta de compaixão de Jonas.

“Naqueles pobres homens houve incomum grau de humanidade e sentimentos de ternura” por Jonas (Adam Clarke). Eles esperavam que houvesse uma saída para salvar a vida de um homem. Mas Jonas estava indisposto a mexer um dedo em favor de tantas vidas humanas.

O capítulo 3 inicia com a afirmação: “Veio a palavra do SENHOR segunda vez a Jonas”. Depois da desobediência inicial do profeta, Deus o chama pela segunda vez e lhe dá uma nova oportunidade de obedecer. Séculos mais tarde, às margens do Mar da Galileia, ouviriam o Senhor dizer a um envergonhado Pedro: “Tu me amas? Apascenta os meus cordeiros.” Deus é o Deus das segundas oportunidades.

Finalmente, Jonas vai a Nínive e prega. E os ninivitas se arrependem. Alguns estudiosos supõem que a história de Jonas deve ter ocorrido entre 750 e 740 a.C., cerca de 130 anos antes da queda da Assíria diante dos babilônios. Se foi esse o caso, o arrependimento daquela geração fez com que Deus acrescentasse misericordiosamente mais um século à existência daquele império.

O versículo que usei no início registra a maior prova do arrependimento daquele povo bárbaro. É fato que os reis dos povos antigos eram considerados deuses ou semideuses. Eram potentados arrogantes e brutais. Mas esse rei assírio desceu do trono, despiu-se de suas vestes reais, vestiu cilício e sentou-se sobre cinzas juntamente com seu povo. Nenhum rei da Antiguidade se sujeitaria a esta forma de humilhação pública como fez o rei de Nínive. Sim, o arrependimento dos assírios foi genuíno e foi lembrado por nosso Senhor Jesus quando Ele condenou aqueles que, possuidores de muito maior luz e maiores privilégios, não se arrependeram:

“No dia do juízo, os habitantes de Nínive se levantarão contra esta geração e a condenarão, pois eles se arrependeram de seus pecados quando ouviram a mensagem anunciada por Jonas; e vocês têm à sua frente alguém maior que Jonas!” (Mt 12.41 – NVT)

No entanto, vemos nesse episódio, mais uma vez, o forte contraste entre o comportamento daqueles pagãos endurecidos pelo pecado, que se arrependeram, e o profeta de Deus, que ficou extremamente contrariado diante do que estava vendo.

Jonas obedeceu e proclamou a mensagem que o Senhor lhe ordenara. Mas foi uma obediência relutante, porque é evidente que seu coração não estava na obra que Deus lhe dera. Jonas não compreendeu o propósito de Israel nem o amor de Deus, pois “o livro de Jonas é o João 3.16 do Antigo Testamento”. Sim, porque o fato de Deus haver concedido o arrependimento a esse povo pagão, ao império mais cruel do mundo antigo, mostra não somente a abrangência, mas também a qualidade do Seu amor — principalmente porque esse amor foi ofertado a um tipo de gente que, por natureza, jamais deveria ser objeto dessa dádiva.

Os filósofos dizem que quem quer ser amado deve ser amorável, ou seja, digno de ser amado. Uma pessoa amorável é uma pessoa terna, meiga, gentil. É fácil amar alguém assim. Mas o amor de Deus em Cristo é totalmente estranho a esse conceito.

“Mas Deus, sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo — pela graça sois salvos.” (Ef 2.4-5)

“…mas Deus prova o seu próprio amor para conosco, pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores.” (Rm 5.8)
Em outras palavras, o amor de Deus é oferecido a pessoas desagradáveis, indelicadas, invejosas, ofensivas, repugnantes, antipáticas, rudes, odiosas, detestáveis. Aliás, detestável é o antônimo perfeito de amorável.

É sobre isso que Jonas nos fala. E um fato ainda mais espantoso do que Deus ter dado o seu amor àquele povo detestável — o fato ainda mais extraordinário de tudo — é que Ele o deu… a mim. Esse amor compassivo, perdoador, paciente, tolerante, santificador, consolador, foi dado a mim… e a você… a nós!

Espero que Jonas tenha afinal aprendido isso, pois Deus não largou mão do seu profeta pecador. E não vai largar mão de nós… Mas não esqueçamos que grandes peixes ainda nadam no mar!

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