Por: César Miranda dos Santos | Prompte et Sincere

    Uma das queixas mais frequentes em minha prática clínica diária é a chamada “ansiedade”. Raramente se passa um dia de atendimento em meu consultório sem que um dos pacientes expresse seu desejo por um “medicamento para sua ansiedade”. Essa “solução” que nossa sociedade construiu, de haver tratamento medicamentoso para nossas ansiedades, tem causado muitos problemas. O termo “ansiedade” passou a ter uma conotação semelhante a gripe ou dor de cabeça. Não podemos negar que existem situações de transtornos orgânicos objetivos (não tão frequentes) que podem precipitar ou agravar um “quadro de ansiedade”, mas tais situações são a exceção e não a regra.

    No meio médico, tanto os profissionais quanto os pacientes, em sua maioria, são incrédulos, logo, não é de se estranhar a busca por essa solução. Eu fico muito constrangido em constatar a liberalidade que muitos profissionais médicos infelizmente têm em atender ao pedido de seus pacientes por algum “remédio para ansiedade”, sem uma avaliação criteriosa e elaboração de um diagnóstico sólido. Mas o que tem me causado mais espanto e grande tristeza é que essa visão, totalmente humanista e pragmática, tem entrado nas igrejas e contaminado o entendimento de muitos líderes e pastores. Tenho ouvido relatos de crentes que passam por problemas familiares, problemas financeiros ou outros vários e ao buscar “aconselhamento” com seus líderes são orientados a procurar um psicólogo ou a tomar um “remedinho”.

    Do ponto de vista bíblico, só há uma abordagem profícua para as “ansiedades”, a saber, descansar verdadeiramente no Senhor, atendendo ao chamado de Jesus: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei…” (Mt 11.28). A ansiedade frequente não é compatível com um adequado relacionamento com Deus. Jesus exorta seus discípulos: “Por isso, eu vos advirto: não andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que haveis de comer, nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir (Lc 12.22). As ansiedades devem ser abordadas (pelo conselheiro cristão) de forma cuidadosa, amorosa e paciente, porém firme e confrontadora; o aconselhamento deve ser noutético. Segundo Jay Adams, “para ser bíblico o aconselhamento deve ser noutético, palavra transliterada do grego e que tem relação com confronto e exortação (confronto com o pecado pessoal na vida do aconselhado). Por trás de toda doença não orgânica, encontra-se um pecado pessoal que deve ser confrontado para que ocorra o arrependimento, ou seja, a mudança de comportamento”.

    O Apóstolo Paulo nos orienta: “Seja a vossa moderação conhecida de todos os homens. Perto está o Senhor. Não andeis ansiosos de coisa alguma; em tudo, porém, sejam conhecidas, diante de Deus, as vossas petições, pela oração e pela súplica, com ações de graças. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará o vosso coração e a vossa mente em Cristo Jesus.” (Fp 4.5-7 – grifo meu).

    Paulo indica a postura que evitará muitos problemas, conflitos e ansiedades, que é a moderação. A moderação nas atividades laborais, nas ações e reações em geral, buscando sempre a prudência e a paciência. A instrumentalidade da Igreja é maravilhosa para nos auxiliar numa caminhada “com toda a humildade e mansidão, com longanimidade, suportando-vos uns aos outros em amor” (Ef 4:2).

    No verso seis, a admoestação não poderia ser mais clara, pois o crente não pode dar lugar às ansiedades, antes deve confiar na soberania, sabedoria, graça e providência de Deus. Se formos honestos em responder o que é que motiva a ansiedade, concluiremos que é a insegurança e a incerteza, logo, a ansiedade não é compatível com o dia a dia do crente, pois tais palavras significam respectivamente falta de segurança e falta de certeza.

    É certo que mesmo os crentes ocasionalmente se preocupam, se assustam e sentem medo, mas não podemos dar lugar às ansiedades. Nossa postura, como nos orienta Pedro, deve ser de lançar “sobre ele toda a vossa ansiedade, porque ele tem cuidado de vós. Sede sóbrios e vigilantes” (1Pe 5.7-8).

    O fato de confiarmos na provisão do Senhor não pode nos levar a uma postura passiva, no sentido espiritual; antes, tudo o que planejamos, desejamos e necessitamos deve ser colocado diante de Deus, “em tudo, porém, sejam conhecidas, diante de Deus, as vossas petições. Temos a tendência de só buscar a Deus quando “a coisa está preta”, ou seja, quando achamos que em uma determinada situação podemos precisar do auxílio dele (como se houvesse situação diferente). No dia a dia, em nossa rotina habitual, raramente buscamos o Senhor ou sua orientação, pois pensamos ser autossuficientes. Mas devemos apresentar ao Senhor tudo e buscar ao Senhor em tudo! Devemos desenvolver essa postura e reconhecer nossa total dependência do Pai buscando sua orientação diariamente para todas as áreas da vida.

    Que essas verdades expostas nos confrontem a não viver ansiosos, promovendo mudança de postura e mesmo arrependimento.

    Volto a afirmar que realmente existem situações de transtornos orgânicos objetivos que podem precipitar ou agravar um “quadro de ansiedade”. Tais casos demandam tanto aconselhamento bíblico como abordagem médica, mas tais situações são a exceção e não a regra. Que o Senhor nos oriente e capacite a lançar sobre ele toda a nossa ansiedade.

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M.D., I.M.S., M.C.S Belo Horizonte, MG, Brasil. Presbítero regente da Igreja Presbiteriana do Brasil em Belo Horizonte, MG, 2000-. Médico formado pela Universidade Federal de Minas Gerais em 1994 (M.D.). Especialização e Residência em Clínica Médica/Medicina Interna (IMS); Mestre em Estudos Cristãos (M.C.S.) pela FITRef. Professor de Aconselhamento Pastoral de 1999 a 2000 na Faculdade de Educação Batista Nacional e em 2004 na Faculdade de Teologia de BH; autor de Doença à Luz da Bíblia e A Enfermidade na Vida Cristã. Diretor Clínico do Hospital Público Regional de Betim, 2019-2021. Membro do Board of Directors da FITRef desde 2019.

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